Para organizações de segurança pública, governador se mostra contra um programa de segurança pública que mostrou eficácia
por
Ana Carolina Montoro
4 de janeiro de 2024
IG
Entidades ligadas às áreas de segurança pública e direitos humanos demonstraram preocupação com o posicionamento de Tarcísio de Freitas (Republicanos). O governador do estado de São Paulo questiona a efetividade das câmeras de segurança do programa Olho Vivo nos uniformes dos policiais militares do estado de São Paulo, embora estudos tenham mostrado que a medida trouxe benefícios à segurança.
Por meio de nota conjunta, seis organizações se posicionaram de maneira contrária às declarações feitas pelo governador em uma entrevista concedida por ele ao Bom dia SP, da TV Globo, transmitida na terça-feira (2). As organizações mostraram dados que comprovam a efetividade dos equipamentos usados há três anos pelos agentes da corporação na diminuição da letalidade policial. Assinaram o documento as seguintes entidades: Conectas Direitos Humanos, Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Instituto Sou da Paz, Instituto Igarapé, JUSTA e Núcleo de Estudos de Violência da USP (NEV).
“A gente não descontinuou nenhum contrato. Os contratos permanecem. Mas qual a efetividade das câmeras corporais na segurança do cidadão? Nenhuma”, disse Tarcísio. Em seguida, ele apontou para o que considera um melhor direcionamento da verba de segurança pública.
“Preciso investir pesado em monitoramento. Isso custa muito dinheiro. É a melhor aplicação do recurso que a gente está buscando para proteger o cidadão”. Segundo o governador, o plano para 2024 é ter mais cinco mil homens no centro da capital paulista e 500 viaturas atuando na região.
“Se você aumenta policiamento ostensivo, você vai fazer menos abordagem porque vai dissuadir o crime. E combinar mais investimento em iluminação pública para dissuadir o crime, porque iluminação pública afasta o criminoso”, defendeu Tarcísio.
Para o coordenador de projetos do Instituto Sou da Paz, Rafael Rocha, o governador de São Paulo escolhe entre “vigiar a polícia ou a criminalidade”, colocando essas medidas de segurança pública como opostas. Para o especialista, elas são complementares e devem ser executadas simultaneamente.
Desde a campanha eleitoral e ao longo do seu primeiro ano de mandato, Tarcísio fez declarações ambíguas sobre as câmaras corporais nos uniformes dos policiais militares e pela primeira vez, se posicionou de forma clara sobre o tema, ao se mostrar a favor do que as organizações chamam de “desmonte”.
Implementado no segundo semestre de 2020, durante a gestão de João Dória, o programa Olho Vivo surgiu dentro da própria Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP), após anos de estudo e análises de experiências internacionais. Ele foi o primeiro do Brasil a utilizar câmeras que gravam as imagens de forma ininterrupta.
Após três anos, estão em operação 10.125 câmeras que cobrem 52% do efetivo policial do estado. Veja alguns números onde especialistas apontam a efetividade do programa.
— 62,7 % de queda na letalidade policial entre 2019 e 2022, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública;
— 57% de redução no número de mortes decorrentes de intervenção policial e de 63% nas lesões corporais causadas por policiais, de acordo com a FGV, com a colaboração da PMESP;
— 46% menos mortes de jovens entre 15 e 24 anos, aponta o Sou da Paz
Uma parceria entre o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Unicef também mostraram a diminuição da morte de policiais em serviço após a implantação do equipamento. O número de PMs vítimas de homicídio no horário de trabalho passou de 18 em 2020 para 4 em 2021 e 6 em 2022. Estes são os menores números registrados em toda a série histórica feita desde 2013.
“Há uma série de indícios demonstrando que a atuação policial melhorou após a operação Olho Vivo. São menos policiais mortos, mais ocorrências registradas, menos denúncias contra policiais. É um programa muito efetivo, que em 2023 começa a enfraquecer”, analisa o especialista do Sou da Paz.
As organizações olham com preocupação para a sequência de cortes de verba do programa.
Enquanto a Assembleia Legislativa de SP (Alesp) aprovou um orçamento de R$157 milhões para serem gastos até atingir a meta de 15.300 câmeras em 2023, Tarcísio diminuiu o valor para R$136 milhões. Além disso, realizou dois cortes em montantes significativos que seriam usados no projeto.
Em agosto do ano passado, remanejou R$11 milhões e em outubro, outros R$15 milhões, argumentando que o valor iria para diárias do efetivo policial.
Desde 2020, as câmeras usadas pelos polícias e o sistema de armazenamento das imagens são viabilizadas por meio de dois contratos de comodato com a empresa Axom. Esses contratos terminam em julho de 2024 e, caso não sejam renovados, o programa acaba.
Para Samira Bueno, do Fórum de Segurança Pública, as duas questões principais em torno do tema são: se o governo fará a renovação dos contratos e, caso isso aconteça, se o formato atual será mantido.
A especialista explica que o governo Tarcísio argumenta sobre o fato das gravações atuais encarecem o contrato, uma vez que elas são ininterruptas. Samira reconhece que o valor é mais alto por causa desse fator, mas vê com preocupação qualquer alteração do formato atual.
“A abertura de uma nova licitação internacional do formato como é necessário para o programa Olho Vivo demora mais de um ano. Se o contrato atual não for renovado, ele chega ao fim.”
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